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2 de julho de 2008

Tenho quartos para alugar

Que estranho ter acordado neste 1 de Janeiro de 1926 e ter o casarão vazio. Habituei-me ao bulício desta casa e agora custa-me percorre-la vazia. Não sinto o cheiro do arroz de pato, que uma simpática senhora de Alcobaça, que por aqui passava, por ser amiga da D.Hilda, uma governanta que aqui existiu em tempos e que por amizade insistia em cozinha-lo por o saber, tão do gosto da nossa velha Hilda, filha de família outrora abastada.

Vou colar nos vidros das janelas, o triângulo indicativo, de que se trata de quarto para alugar. Hoje, que decidi manter a casa aberta, por mais algum tempo. Não vou conseguir mais do que 2 mil réis pelo aluguer, a vida está difícil, com grandes dificuldades económicas porque os preços dos bens alimentares não param de subir e os salários estão cada vez mais baixos. Desde o fim da Guerra Mundial tem sido sempre assim.

Alves dos Reis foi preso no fim do ano passado, por causa daquela trapalhada, das notas falsas e da confusão que se gerou no Banco de Portugal, com toda a gente a crer trocar as notas falsas.

Como eu percebo afinal o presidente
Teixeira Gomes que ao partir para o exílio, desabafou , que se libertou da gaiola dourada de Belém e que os políticos eram intoleráveis. Achei interessante esta analogia com a liberdade dos passarinhos, que nenhum político até hoje se lembrara de estabelecer, se calhar uma dia virá que algum se lembrará de o citar.

Claro que ao novo presidente Bernardino Machado seguiu-se um novo governo com o António Maria da Silva a presidir, vamos lá a ver o que é que isto vai dar, mas o povo já não acredita em nenhum, sobretudo nos que já entram derrotados.

De lá de fora ouvem-se notícias bem mais animadoras. Li no jornal O Século, que na Inglaterra surgiram, leis de subsídio de viuvez, orfandade e velhice e leis sobre habitação social e subsídio de desemprego.Não me parece que cheguem cá tão depressa.

Por cá tomara termos emprego e mantê-lo, para poder mitigar a fome e comprar uma alpercatas e umas gangas que a mais o povo não aspira.

Não, mais do que vinte e cinco tostões vou pedir pelo quarto, só queria é que aparecesse alguém com emprego estável, no Estado, na Banco ou empregado do Grandella porque são lugares com futuro, para que se não ande sempre a mudar.
Além disso gostaria que aparecesse alguém com gosto pela poesia o pela ópera, para que se pudessem fazer aqui uns serões agradáveis com um pouco de cultura.

Se houver interesse, talvez aceite mandar vir uma criada de servir, já que me falaram duma pequena ali da zona saloia da Malveira, que se ajeita na cozinha e com quartos todos alugados, me meteria em aprontar serviços de governanta, cargo para o qual também já me falaram duma tal Maria, uma beirã que dizem muito alinhada e asseada, vamos ver.

Se o meu aparelho de rádio, não estiver dessincronizado e não tiver ar na canalização, vou ouvir o CT1 AA, que começou a trabalhar com muito êxito do ano passado, graças aos esforços do sr. Abílio Nunes dos Santos

Casa Comum, 1 de Janeiro de 1926

6 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Não, não venho para alugar quarto, porque felizmente tenho casa
Só vim dizer ao Senhor que Bernardino Machado é meu padrinho
O meu pai que é General, era muito amigo do meu padrinho, os dois republicanos, mas zangaram-se porque meu pai nunca aceitou extremismos, apesar de na altura do regicídio, ser-se Republicano, sendo para mais General, já era ser-se extremista.
No entanto acolheu na sua casa, correndo perigo de vida, todas as freiras do colégio onde eu andava e muitos padres conhecidos das redondezas.
Sei pouco de política de hoje em dia, talvez por não conseguir distanciamento.

cordialmente

Chiquita

Luís Maia disse...

Obrigado Chiquita

Obrigado pelo seu comentário.Se quiser dizer ao Sr. General seu pai que se um dia tiver disponibilidade de passar lá por casa, podemos conversar um pouco sobre toda essa experiência à volta duns scones e dum cházinho eu ficaria muito honrado.

Somos assim em 1926, os conceitos e honra e de cavalheirismo são diferentes do que outros tempos por certo trarão.

Táxi Pluvioso disse...

Portugal é o país perfeito. A vida continua tal e qual, mais TV a cores, menos Playstation...

Luís Maia disse...

Caro Táxi

Nem me ocorre pensar outra coisa, aliás é o objectivo que norteia 90% dos meus blogues.

Para entrar para a Casa ao contrário do que se possa julgar, não é preciso saber de História, basta escrever com o espírito da época, tentar limitar a sua escrita ao que supõe ser a vivência da época.

O meu amigo que percebe de transportes e de meteorologia, e de muito mais coisas, por 2$50 por mês pode ter lá um quartinho

Um abraço

Anónimo disse...

Extraordinário blogue este, infelizmente só hoje descoberto los labirintos da Net. Com leitura retrospectiva certa para muitos dias, quiçá semanas. Uma qualidade rara aqui se demonstra, entre muitas mais : a inteligência dos autores. Fiquei fã!

Temas e Instituições