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28 de fevereiro de 2009

Cantando espalharei por toda a parte


Casa Comum, 31 de Agosto de 1935

Cara amiga


Com a "rapidez" que caracteriza o governo de Salazar, que se move à velocidade média de um caracol, muito por força da sua mentalidade desconfiada, a isso se deveu a demora na inauguração oficial da Emissora Nacional o que finalmente aconteceu em 1 de Agosto passado, já que pelo menos desde 1933, se andaram a fazer emissões experimentais a partir de um emissor de Onda Média de 20 Kw instalado em Barcarena.


Contudo, desde 1930, data em que foi criada a EN, na dependência dos CTT, a Direcção dos Serviços Radioeléctricos autorizara a aquisição de dois emissores de Onda Média e Curta.


Portanto 5 anos para arrancar a emissora é tempo demasiado, mas finalmente lá avançou

"Cantando espalharei por toda a parte". a camoniana divisa da estação, cujo primeiro director artístico é o Dr.António Joyce, um distinto advogado lisboeta, mas formado em Direito em Coimbra e senhor de vasta cultura, com formação musical, tendo sido há uns anos atrás reorganizador do Orfeão Académico de Coimbra.

Duvido é que ele tenha paciência, para aturar a fiscalização que vai ter da parte do poder. ele que não sendo um homem de políticas, tem no seu currículo, ter secretariado o Presidente Teixeira Gomes, nos tempos da República, que ele por certo não esqueceu.


Os estúdios são na rua do Quelhas, não muito longe afinal do "escritório" do botas, que não dorme em serviço, afinal António Joyce é só o director artístico, provavelmente responsável pela qualidade da programação mas os chefes são de confiança, a Direcção é constituída pelo cap. Henrique Galvão, Eng. Manuel Bivar e Dr. Pires Cardoso, tudo gente da "casa".


Afinal o Dr.Salazar não se esquece de fomentar (direi controlar) a diversão, pois também criou há dias concretamente em 13 de Junho passado, a Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho, conhecida como FNAT, que se propõe igualmente organizar os tempos livres dos trabalhadores.

Não sei o que isso irá dar, mas naturalmente que a preocupação de tudo estar sob controlo também o leva não deixar ao acaso as hora livres dos trabalhadores, eventualmente as mais perigosas, pensará ele.


Ficará então tudo sobre controlo, os dias de trabalho e os de folga também, é esta a essência do estado corporativo.

Só aparentemente escapará a vertente religiosa, mas a confiança depositada no amigo Cerejeira o cardeal de Portugal, que não deixará margem para outras fantasias, que ultrapassem o espírito beato, da máxima salazarista do "pobrezinho mas feliz, que vai à missa ao domingo".


Então e as suas férias ? julgo que em Setembro como habitualmente irá para a Praia das Maçãs. Embora francamente não saiba onde vc irá ficar, pelo menos desde o incêndio do Royal Hotel Bellevue, em 1921, que era poiso certo. Depois informe-me que eu apanho o eléctrico em Sintra e vou visita-la

Vamos ouvir os Prelúdios de Liszt ? Parece-me uma boa escolha neste tempo de Verão.

22 de fevereiro de 2009

As marionetas do senhor Reitor



Casa Comum, 31 de Maio de 1935

Caríssimo amigo

Ele há coisas que parecem de propósito, coincidências engraçadas que me ocorreram.

Olhe meu amigo, eu fui ao Tivoli, ver o filme do Leitão de Barros,
As pupilas do senhor reitor, baseado na obra do Júlio Dinis com Joaquim Almada (Reitor), Maria Matos (Senhora Joana), António Silva (João da Esquina), Leonor d’Eça (Margarida), Maria Paula (Clara), Oliveira Martins (Pedro), Paiva Raposo (Daniel) e Lino Ferreira (João Semana).

Vi toda a gente muito entusiasmada com este filme, mas eu não gostei muito, mal por mal preferi a Severa.

O curioso contudo, foi o título, quando vivemos num país, cada vez mais do senhor Reitor Salazar, onde paradoxalmente se colhe a sensação que o presidente da Republica Oscar Carmona, que foi "reeleito"(pela União Nacional) em Fevereiro, para um novo mandato, se perfila como mais uma marioneta ao dispor do ditador.

Os papéis estão completamente invertidos, deveria ser o cargo de presidente do Conselho de Ministros merecer a confiança do Presidente da República, mas aqui é ao contrário, é este que está refém do senhor Reitor.

Uma das coisas que incomoda Salazar é aquilo que denomina, ou o "porta voz" o deputados José Cabral o faz por ele, a existência das chamada "sociedades secretas", que nós sabemos muito bem ele querer atingir a Maçonaria. Onde se encontra concentrada a grande força da oposição, pelo menos a de característica mais intelectual. razão porque foram extintas por decreto de 21 de Maio passado, todas as associações secretas.

De certo modo, também engloba nesta proibição, outro tentáculo organizativo mais popular o Partido Comunista Português, que além de partido político, também é secreto e muito activo.

Em Itália já tinha acontecido, e Portugal não podia fugir à tradição fascista de se apropriar do símbolo que envolve o dia do Trabalhador a 1 de Maio, que é relevante para o movimento sindical e operário, naturalmente se a sua orientação, a sua chefia não for formada por "delegados do governo", mais um grupo de "pupilos do senhor Reitor", "secretariado" pela vigilância musculada da PVDE.

Sendo assim assinale-se que, tivemos este ano em grande estreia o Dia do Trabalho (uma nuance), com festejos oficiais elaborados pelo governo, incluindo um magnífico desfile de organismos corporativos, em Belém saudando o presidente da República .


Por hoje fico por aqui, mas deixo-lhe um postal musical diferente Sibelius um finlandês de sucesso que em 1923 estreou a sua 6ª Sinfonia em ré menor.

13 de fevereiro de 2009

A farsa eleitoral de 1934

Casa Comum, 23 de dezembro de 1934

Cara amiga

Fui ver o recém estreado filme do António Lopes Ribeiro, o Gado Bravo, e lhe digo que não gostei, estamos muito atrasados em matéria de cinema, bem seria de admirar que assim não fosse, afinal trata-se apenas da 3ª filme sonoro, mas em comparação com o que vimos passar nas nossas salas, vindo lá de fora, é uma tristeza.

Mal interpretado e cheio de imperfeições técnicas o que me espanta atendendo a que este filme tem o Raul de Carvalho como principal papel, que como se sabe é um excelente actor de teatro mas parece que há dificuldade em se adaptarem à técnica cinematográfica.

Num ano em que Frank Capra ganhou o Oscar com essa notável comédia It happened one night, com o Clark Gable e a Claudette Colbert, é só vermos as diferenças.

Já há um tempo que se adivinhava que Rolão Preto acabaria preso e assim aconteceu, ao mesmo tempo que ilegaliza o Movimento Nacional-Sindicalista, pondo termo ao um processo de dissidência interna, obriga-o a exilar-se bem como a Alberto de Monsaraz.

Salazar continua a organizar o seu estado autocrático corporativo, criou o Conselho Corporativo, que ele considera o órgão superior da organização corporativa nacional, tipico das organizações fascistas em geral. Presidido pelo presidente do Conselho de Ministros, tendo como membros permanentes os restantes ministros, dois professores de Direito Corporativo e membros eventuais, por convite.

Deveríamos ter ficado todos felizes, por terem acontecido, as primeiras eleições legislativas após o golpe de 28 de Maio, já lá vão 8 anos. Deveríamos de fosse possível, chamar aquilo eleições, mas o que aconteceu em 16 de Dezembro passado foi uma farsa. Apenas a União Nacional foi autorizada a concorrer elegendo naturalmente os 90 deputados do círculo nacional único.

O afastamento dos cadernos eleitorais de cidadãos que não interessavam e paradoxalmente os analfabetos, que o governo é em primeira análise o responsável por existirem, não contado com a total ausência de fiscalização quer do acto eleitoral, quer da própria contagem.

Afinal estavam inscritos nos cadernos 478 121 eleitores e votaram 377 792, apesar de tudo um número ridículo para o nosso País

Descobri esta coisa dum tal Almirante um cantor e radialista brasileiro, ligado às coisas do samba que com bom brasileiro que é e inventou esta redescoberta da História do Brasil.

Gostou? Então clica aqui e escuta mais!



10 de fevereiro de 2009

Salazar e Carmen Miranda duas estralas em ascensão



Casa Comum, 31 de Maio de 1934

Cara amiga

Você já ouviu falar nesta pequena, que nasceu no Marco de Canavezes em 9 de Fevereiro de 1909 que foi para o Brasil pequenita com o pai, por lá cresceu e tem uma voz magnifica e muito talento ?

Tem feito grande sucesso a partir de 1930, quando gravou a marcha "
Pra Você Gostar de Mim" . Antes do fim do ano, já era apontada pelo jornal O País como "a maior cantora brasileira", a nossa Carmem Miranda, afinal mudou de nacionalidade, também não admira, ela foi para lá com 1 ano.

A dois dias do 6º aniversário da revolução militar, Salazar reuniu o I Congresso da União Nacional, como nada é feito por acaso, pelo homem, esta-se mesmo a ver que procura a identificação do Estado Novo com aquela revolução, diluindo o papel dos militares, que a promoveram.

Salazar discursou na abertura e no encerramento do Congresso na Sociedade de Geografia, disse a economia liberal que nos deu o supercapitalismo, a concorrência desenfreada, a amoralidade económica, o trabalho mercadoria, o desemprego de milhões de homens, morreu já. Receio apenas que, em violenta reacção contra os seus excessos, vamos cair noutros que não seriam socialmente melhores.

Os habituais engraxadores também se destacaram, com os discursos habituais a ver quem consegue ser mais ridículo que o parceiro, talvez o prémio vá para o Lopes Mateus que sábia e lapalissianamente proclama "quem não é por Salazar é contra Salazar".

A oportunidade deste congresso, como já lhe disse, culmina um tempo de quezília com a hierarquia militar que pressionam Carmona, revoltados pela forma como Salazar monopoliza o protagonísmo político e propagandístico. Porém a força de salazar já é muito grande, que obriga Carmona a renovar-lhe publicamente a sua confiança, organizando uma homenagem pública que culmina numa manifestação espontânea da Praça do Comércio.

Vou terminar dizendo-lhe que se confirma a acusação que você me faz de andar apaixonado pelo Rachmaninov, mas que fazer quando aquele malandro, compõe coisa como esta Sinfonia nº2 ?

5 de fevereiro de 2009

A greve na Marinha Grande

Casa Comum, 31 de Janeiro de 1934

Cara Severa

Para muita gente que julga que somos uma gente amorfa e sem capacidade de luta, eis o desmentido, a reacção ao "pacote corporativo" que o Salazar inventou, para domesticar o povo em geral e os trabalhadores em particular.

Eis pois essa insurreição nacional em 18 de Janeiro de 1934 que resulta indirectamente de um longo processo de luta social e sindical , e como contestação à ofensiva corporativa contra os sindicatos livres, por força do recém-publicado “Estatuto do Trabalho Nacional e Organização dos Sindicatos Nacionais” em Setembro do ano passado.

A ideia de domesticar a luta de classes, poderá ter passado pela cabeça do coimbrão, mas ele não pode contrariar o curso da história, poderá só atrasa-lo pela força.

A colaboração das classes sociais com vista à harmonia do capital e do trabalho, sob a bandeira do “interesse nacional”, leia-se "interesse patronal", tem como objectivo o controlo dos sindicatos pelo Governo, que tem ainda poderes de fiscalização, intervenção e orientação de toda a actividade sindical e da contratação colectiva do trabalho.

Para a grande parte das organizações sindicais era impensável a dependência do Estado e a perda de autonomia e liberdade, bem como a colaboração entre patronato e classe operária, num equilíbrio extremamente desigual de forças.

Esta realidade acabou por gerar elos de união entre os sindicatos, a Confederação Geral do Trabalho (anarco-sindicalista), a Federação Autónoma Operária (socialista) a Comissão Intersindical (comunista) em torno do objectivo da greve geral revolucionária de 18 de Janeiro de 1934, a qual deveria ter irrompido em simultâneo com uma sublevação militar republicana ,que não chegou a acontecer, como sempre minha cara, em virtude da velha pecha nacional, chamada desorganização.

Registaram-se greves gerais de carácter pacífico em Almada, Barreiro, Sines, Silves, e manifestações operárias, mais ou menos um pouco violentas na Marinha Grande, Seixal, Alfeite, Cacilhas e Setúbal.

O centro industrial vidreiro da Marinha Grande foi onde a greve foi mais bem organizada e resistente sob a direcção dum tal José Gregório, um militante comunista, mas a força militar acabou por levar a melhor o número de detidos na Marinha Grande teria ascendido no mínimo, a 130 pessoas, por enquanto, e não auguro lhes aconteça nada de bom, porque segundo já ouvi dizer o Salazar, está a pensar mandar construir uma prisão, em Cabo Verde, donde escapar com vida, se tornará por certo impossível.

No passado dia 28, na sessão do "desagravo" no Teatro São Carlos quando da apresentação da Acção Escolar de Vanguarda, promovida por João Ameal e Manuel Múrias sob a Presidência de Carmona o ditador discursa referindo que o comunismo é a grande heresia da nossa idade.

Como a questão da greve geral, fosse uma jornada de luta pela implantação duma sociedade bolchevique e não estivesse em causa, como motivo primeiro as deploráveis condições de trabalho, que se apresentam aos trabalhadores, com horários de 12 horas por dias nas fábrica e o sol a sol nos campos, em em ambos os casos tudo em extrema precariedade.


A minha sugestão musical para hoje (até pode parecer que é por acaso), é a audição da abertura do Sonho duma noite de verão de Mendelssohn.

Temas e Instituições